Quando disseram a Leonidas que as flechas dos
persas eram tantas que cobririam o céu, ele respondeu: “melhor, combateremos à
sombra”. Faço minhas as palavras do espartano, ao ver que meu oponente escreveu
uma réplica com quase o triplo do tamanho combinado.
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Resumindo a minha tese, eu afirmei que o governo Dilma era disfuncional e que,
sendo o julgamento no Congresso eminentemente político, estavam dadas as condições
para o seu impeachment: falta de sustentação política e social grave crise
econômica, que só piora com a sua permanência.
Pretendo mostrar que minha tese não foi refutada, apenas distorcida, e que todas as alegações apresentadas permanecem de pé. Meu oponente afirmou:
“É possível notar ao longo de todo relato do Marco Lisboa, a tentativa comum de fundamentar o pedido de impedimento da presidente eleita no pleito de 2014 apelando para razões não previstas na legislação tais como crise econômica e popularidade baixa, adotando com isso um viés político e não jurídico...”
Comparem com o que eu afirmei.
“São condições necessárias, portanto, baseado em nossa história recente, - uma crise gravíssima e a perda definitiva de sustentação do governo. Não são suficientes, porque é necessário um fundamento jurídico para o pedido. Mas são determinantes.”
Meu oponente substituiu falta de sustentação (política e social) pela conveniente “popularidade baixa”. Note-se que não se trata mais de “fundamentar” o pedido, pois isso já foi feito, sobejamente, por uma plêiade de juristas, capitaneada por Hélio Bicudo. Fundamentação que foi considerada suficiente por quem de direito: o presidente da Câmara. Estamos falando portanto de um pedido aceito e já em tramitação. Em momento algum, afirmei que os “fundamentos” para o pedido eram políticos e econômicos. Pelo contrário, afirmei, com todas as letras, que era necessário um fundamento jurídico. Apenas me recusei a chover no molhado, por se tratar de uma questão superada.
Inconformado com o acatamento do pedido, feito dentro das normas aplicáveis, meu oponente pretende reabrir essa questão:
“... refuto o argumento de que a questão jurídica já está superada pelo simples fato do pedido escrito pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Conceição Paschoal ter sido acolhido, não está, essencialmente porque "É preciso garantir transparência e legalidade na análise do impedimento" conforme foi dito pelo advogado geral da união Luís Adams em entrevista no dia 11/12/15.”
Essa nova flechada não pode obscurecer o sol, quanto mais a razão. A saber, o próprio STF, provocado sobre o acatamento do pedido de impeachment, já havia afirmado que caberia ao presidente decidir sobre seu acolhimento. O plenário seguiu em frente e passou à votação da comissão que iria analisá-lo. A presidente afirmou em discurso que iria se defender com todas as armas previstas pelas leis e pela constituição e pediu celeridade. Ou seja, os congressistas e a presidente dão como certo que o pedido foi acolhido e está tramitando.
“Por lei, cabe ao presidente da Câmara dizer se aceita ou não um pedido de impeachment. ... Cunha estabeleceu, entre outros pontos, que, em caso de rejeição, cabe recurso ao plenário, onde bastaria o voto da maioria dos presentes à sessão para que seja dada sequência ao pedido. ... A decisão do STF rejeitou essa possibilidade de recurso: ou o presidente da Câmara acolhe o pedido e dá encaminhamento ao pedido -o que inclui posteriores análise por comissão e votação em plenário para abrir o processo– ou o pedido é arquivado.” http://goo.gl/vjnwTo grifos nossos.
Os persas não queriam combater Leônidas numa passagem estreita, preferiam um terreno mais favorável. Entretanto, o caminho para Atenas passava pelas Termópilas. Meu oponente não quer entrar na discussão das razões políticas e econômicas do impeachment e tenta, mais uma vez, trazer o combate para o campo jurídico:
"Qual é o órgão que decide em última instância a ocorrência de irregularidades jurídicas? É o Judiciário. O Legislativo não tem essa prerrogativa". Fonte: http://goo.gl/3kXFJ9…
Portanto os congressistas não detêm o poder de sentenciar e encerrar a questão dando a "palavra final" que pode e será revertida no STF.”
Que o STF é o guardião da Constituição é ponto pacífico. Outro ponto pacífico é que legislativo e judiciário são poderes harmônicos e independentes e que o legislativo pode e deve aplicar as leis e o seu regimentos sem necessitar da tutela do Supremo. Entretanto, há aqui um detalhe crucial: a decisão “pode e será revertida pelo STF” Traduzindo, meu oponente quer ter razão antecipando uma decisão, que poderá, oxalá, acatar uma tese duvidosa.
Eu prefiro seguir com a realidade.
Finalmente, os persas entraram no desfiladeiro:
”Quanto ao argumento apresentado com as seguintes palavras do Marco Lisboa: "Politicamente, Dilma representa um modelo esgotado, o populismo, que está ´em retirada na América Latina. A base aliada esta´ dividida. A recente votação das chapas para a comissão do impeachment o demonstrou. Se sobreviver, Dilma não governa", refuto com veemência a seguir...”
O que se segue é uma definição canhestra de populismo, retirada do site Infoescola, e uma tentativa de mostrar que os governos petistas, Dilma em particular, não se inserem no populismo latino-americano.”
Essa discussão, por si só, merece um novo debate e eu não vou ser irresponsável de adentrar nele. O populismo é um fenômeno profundo e recorrente em nossa América Latina e já foi estudado com uma profundidade bem maior do que a do Infoescola. No entanto, por mais que se queira retirar o rótulo de populista do governo Dilma, seu conteúdo permanece inalterado.
Estamos adentrando em uma depressão que pode nos levar a mais uma década perdida. O governo não tem sustentação política e nem apoio na sociedade.
O que o meu oponente contrapôs a essas alegações?
“Quanto a referida votação na câmara das chapas sequer comentarei pois essa já é alvo de questionamento no STF por flagrante desrespeito à constituição e norma do regimento interno.”
Note-se, de passagem, que se o STF se pronunciar sobre a forma de escolha da comissão, liminarmente, ele já terá reconhecido a legitimidade do pedido! Não vou argumentar baseado em suposições sobre decisões futuras do STF. A Suprema Corte pode até anular essa votação, mas não pode apagar o seu placar: 272 votos a 199. Este número mostra o grau de isolamento do governo Dilma. São vinte e poucos votos a mais do que o necessário para se salvar do afastamento. A presidente reconheceu a derrota, pressentiu que o tempo corre em seu desfavor e quer votar o mais rápido possível, para não perder esses poucos votos que já começam a debandar. Eu concordo com a presidente nessa avaliação.
Quanto à popularidade da presidente e seu isolamento perante a sociedade, meu oponente preferiu não comentar. Dizer o quê?
“Ademais quanto ao aspecto econômico é preciso destacar que esse cenário catastrófico descrito pelo Marco não encontra respaldo na realidade, temos tido sim dificuldades mas o Brasil está em situação bem confortável para sobressair a esse desafio...”.
Para subsidiar uma afirmação tão temerária, meu oponente elenca o tamanho de nossas reservas e compara a proporção de nosso déficit em relação ao PIB com a de outros países do primeiro mundo.
Sobre a inflação de dois dígitos, o desemprego crescente, a queda de quase 4% do PIB, a desindustrialização do país, a transformação de um orçamento com superávit de 60 bilhões em um deficitário em 110, nem uma palavra. Mais uma vez, foge para o futuro: “estamos em condições confortáveis para sobressair a esse desafio”.
Eu prefiro ficar com a realidade. Carta Capital, uma revista que não pode ser acusada de oposicionista, caracteriza assim essa situação:
“Um política econômica devastadora O Brasil atravessará dois anos de retração, apontam as estimativas, fenômeno que não ocorria desde 1930”.
Resumindo, minhas teses permanecem de pé. O
meu oponente, como diria a presidente, enfiou a cabeça na areia, como um
canguru australiano. Preferiu apostar numa futura decisão do STF, sobre matéria
que o próprio já apreciou, e numa recuperação milagrosa de nossa economia, onde
ele se sente bem confortável (com 10% de inflação e quase 4% de recessão!).
Fazer o quê?