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A cultura da boçalidade
Por Laerte Braga(*)
O Brasil que emergiu das trevas da ditadura militar foi o do “isso pode, aquilo não pode”. O Congresso Nacional Constituinte – não tivemos uma Assembléia Nacional Constituinte – trabalhou sob o tacão do governo José Sarney, um “coronel” político egresso da ditadura e covarde por natureza. Foi expulso do Planalto pelo ditador João Figueiredo quando lhe comunicou sua candidatura a vice na chapa de Tancredo Neves. Expulso aos palavrões e saiu com o rabo entre as pernas. Faltava-lhe, como falta, estofo para reagir.
É uma dessas figuras untuosas, asquerosas que sobreviveu a ditadura e adequou-se a democracia possível, consentida. Na verdade, além do engodo do Plano Cruzado preocupou-se em estender seu mandato – quatro anos- para cinco e para isso não hesitou em alianças espúrias no Congresso.
Construiu um império político no Maranhão e no Amapá, estado que “representa” no Senado Federal.
Sarney é um episódio lamentável em nossa História, como o foi ACM, ou FHC, nenhum deles, no entanto, sem deixar sua marca na construção dessa “democracia” e essa marca significar um alto preço pago pelos brasileiros.
A boçalidade não é só um policial tascar a mão num preso algemado e indefeso que até que se prove a culpa, inocente. A presunção da inocência é inerente ao direito.
Ela se estende a toda uma realidade que cria a cultura da boçalidade como parte do processo dessa boçalidade. Tanto está no tapa, na humilhação, como está na alegria estampada no rosto dos principais âncoras de telejornais ao anunciar que o presidente Hugo Chávez da Venezuela está doente e pode estar vivendo uma fase terminal. Imagino que intentem soltar foguetes se isso vier a acontecer (esse caráter foi desmentido pelo governo da Venezuela).
Ou no jornalista Caio Blinder (“Hei de ser Paulo Francis!”) ao defender os assassinatos seletivos como forma de buscar a paz. Norte-americanos e israelenses são useiros e vezeiros nessa prática em nome da tal “democracia”.
Quem quer que se aventure a mediocridade dos telejornais brasileiros vai encontrar um farto noticiário sobre barbáries praticadas por Nardonis da vida, ou Gutembergs, mas nada sobre Guantánamo, o campo de concentração dos EUA em território ocupado em Cuba.
Nem sob o julgamento do soldado Bradd Manning, acusado de repassar ao site WIKILEAKS os documentos secretos que mostram as práticas terroristas dos EUA.
Nessas horas Obama, ou qualquer outro, costuma se dirigir ao seu povo, imbecilizado em sua grande maioria pelo fascínio do touro de Wall Street, ou pela gordura transgênica da rede MacDonald’s, para pedir que “Deus abençoe a América e os americanos”. Fala assim levando em conta a totalidade da América, pois é assim que enxerga a América Latina, apêndice do império capitalista.
São cinco mil ogivas nucleares espalhadas pelo mundo – 300 em Israel – para impor a “paz” e os “direitos humanos”. Tanto faz que seja destruir o Iraque, a Líbia, tentar fazer o mesmo na Síria, fechar olhos ao genocídio contra palestinos, ou queimar páginas do Corão no Afeganistão presumindo que fora da superioridade ariana dos texanos nada existe mais no mundo. Só o resto.
Uma emissora de tevê na cidade de Diamantino insinua que o problema dos meninos de rua pode ser resolvido com a eliminação desses. A emissora pertence à família do ministro do STF – Supremo Tribunal Federal – Gilmar Mendes, ligado a FHC e parte do esquema do banqueiro Daniel Dantas.
Ou queimar moradores de rua, prática de alguns jovens de classe média alta.
Pinheirinhos é uma realidade quase diária no Brasil, na cidade e no campo.
O Big Brother Brasil encanta o que William Bonner chama de idiota – Homer Simpson. Os telespectadores do JORNAL NACIONAL. Cada ser transformado em robô estático diante da telinha imagina-se em pleno Coliseu. Ali o polegar para baixo significa morte e para cima vida. Não são gladiadores os que lá estão, mas objetos descartáveis.
O governo dos EUA testam o RAIL GUN, um canhão eletromagnético capaz de lançar mísseis com ogivas nucleares a longas distâncias – qualquer parte do mundo – e a uma velocidade de 8 mil quilômetros por hora.
Uai! Quem tinha armas de destruição em massa não era Saddam Hussein? Kadafi? Quem ameaça a paz não é o Irã?
O estudante Andriew Henrique Barroso Santos, 14 anos, foi morto a tiros por policiais militares do Espírito Santo. A sua morte foi comemorada pelos policiais no perfil da ROTAM – RONDA OSTENSIVA TÁTICA MOTORIZADA – no FACEBOOK. O velho estilo “bandido bom é bandido morto”.
Polícia militar é uma das anomalias do estado de direito, da democracia.
O fato pode ser lido na íntegra na página do jornal GAZETA/ONLINE-GLOBO. Se chegou a estarrecer esse tipo de gente é porque transpôs qualquer limite de barbárie consentida pelos que, em tese, comandam esses bandos armados e fardados de “trabalhadores”.
Está lá a boçalidade saudada
Os protestos de moradores do bairro contra a execução – o estudante foi assassinado quando estava de joelhos e com as mãos à cabeça – foram alvos de críticas dos policiais. Para conter a indignação popular contra a boçalidade do dia a dia dessa aberração (Polícia Militar), foram usadas balas de borracha.
“Menos um FDP. Esse não vai dar mais trabalho. Vai pro inferno capeta” são comentários feitos na rede social. E a ameaça noutra postagem – “parabéns a gloriosa PM . E vamos derrubar mais um monte! Podem tentar a sorte contra nós que o azar já é certo”.
Quem protege professores, sem terra, sem teto, trabalhadores da PM? Em qualquer estado brasileiro.
Usam a sigla PNCL que vem a ser “p… no c… do ladrão”.
Gloriosa aí mudou de sentido, ganhou outro sinônimo. Covardia, boçalidade.
Providências? Ora, o governador é um fantoche, um esperto, está incensando a carreira do irmão no estado de Minas – diretor da CEMIG – numa aliança com Aécio Neves – preso em Porto Seguro ao lado de Luís Paulo Veloso, ambos, anos atrás por delitos já conhecidos do Mineirão desde o jogo Brasil versus Argentina.
A Corregedoria nem afastou das ruas os policiais e nem imagina fazer isso, vai apurar os fatos… O padre Xavier Paolillo, membro do Conselho Estadual de Direitos Humanos vai acionar o Ministério Público estadual, a Defensoria Pública e afirma ter ouvido de outros jovens que estavam com Andreiw no carro que o rapaz não estava envolvido em qualquer tipo de atividade criminosa. Foi o clássico exercício de tiro ao alvo da boçalidade fria e desumana do braço armado do coronelismo político.
Deve ter sido por essas e outras, noutros tempos, que Samuel Johnson escreveu que o “patriotismo é o último refúgio dos canalhas”. Tem valor eterno a afirmação.
Não é só aqui. Na democracia/mãe um jovem invade sua própria escola e dispara contra colegas. Mata dois, fere três e Obama concita os americanos a refletirem sobre a “tragédia”, pede proteção divina e manda pêsames às famílias das vítimas. A mensagem é padrão, esse tipo de acontecimento é corriqueiro por lá.
A democracia precisa ser reinventada ou o exemplo pode ser buscado em Cuba. Zero analfabetismo, zero desnutrição infantil, nenhuma criança abandonada dormindo nas ruas, saúde plena e de excelência. São dados da ONU.
A cultura da boçalidade é parte do processo capitalista e em crises como a atual assume níveis assustadores. Tem que impingir o medo e o pânico nas pessoas, transformá-las em zumbis apavorados e assim se lhes obter a docilidade diante dos fatos e da barbárie que soam e ecoam em todo o mundo no ribombar dos canhões eletromagnéticos.
São exemplos de uma conjuntura estúpida em que a espécie humana é colocada em xeque. E a luta é de sobrevivência, antes que sejamos todos ex-BBB, socialites, enquanto banqueiros, grandes corporações empresariais e latifúndio põem e dispõem a sua ordem boçal.
Meu medo agora é Crivela determinar uma pesquisa científica para determinar se o peixe pescado é gay ou lésbica e eliminar o bacalhau da semana santa. É contra a vontade de Deus. O mesmo de Obama, só que em escala menor. Vão querer psicólogos mergulhando para salvar os peixes da perdição e das penas do inferno.
*Laerte Braga é jornalista e colaborador do “Quem tem medo da democracia?”, onde mantém a coluna “Empodera Povo“.
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