Sobre Margareth Thatcher – Conclusão póstuma.
Margareth Thatcher (Lê-se Margaret Dátcher) nasceu logo após o término da primeira grande guerra e vivenciou a segunda. Em 1925. Isso faz dela uma política experiente em assuntos que a maioria de nós não vivenciou, e essa é uma diferença importante. Enquanto Thatcher via o mundo como algo perigoso, realmente perigoso, a maioria de nós o vê como algo que não vai explodir amanhã. Era advogada e engenheira química.
Tenho visto postagens nas redes sociais sobre a vida e o perfil da ministra, a primeira do Reino Unido. Quase todas essas postagens e artigos são, como é natural, fruto de maior ou menor acuidade de estudos sobre o assunto, mas sempre com conotações particulares segundo o que nela mais chamava a atenção. No entanto, Margareth foi uma figura pública, até certo ponto polêmica, e deve ser analisada sob o ponto de vista dos grupos, sociedades ou nações em que mais diretamente influiu.
O que polvilharia a cabeça de Margareth Thatcher? Certamente o declínio do já passado Império britânico, a guerra-fria, o papel político inglês na Europa unida em torno de tratados eminentemente comerciais visando uma unidade política a futuro, a política das divergências idiossincráticas do Reino unido, a liderança no partido político Conservador a que pertencia, a manutenção de seu posto na Down Street 10, problemas pessoais. De todos os aspectos de sua atuação no governo podemos ressaltar os seguintes que lhe traçam o perfil:
- Em 1960 foi aprovado um projeto de lei seu, exigindo que as autoridades locais realizem as suas reuniões de conselho em público.
- Em 1961, foi contra a posição oficial do Partido Conservador de votar na restauração da prática de castigar com o uso de uma vara.
- Thatcher considerava os judeus residentes em Finchley - onde se elegeu como parlamentar - como "seu povo" e tornou-se membro fundador da Liga de Amizade Anglo-israelita de Finchley, bem como membro dos amigos conservadores de Israel. no entanto, acreditava que Israel tinha que trocar terra por paz e mais tarde condenou o bombardeio de Osirak feito por Israel em 1981 como "uma grave violação do direito internacional".
- Defendeu a política do seu partido de permitir que os inquilinos comprassem sua moradia social.
- Em 1966 opôs-se à política dos trabalhistas de preços obrigatórios e controles de renda, argumentando que isso produziria efeitos contrários aos previstos e distorceria a economia.
- Na Conferência do Partido Conservador de 1966 criticou as políticas de alta tributação do Governo Trabalhista como sendo medidas "não rumo ao socialismo, mas ao comunismo" e argumentou que impostos mais baixos serviam como incentivo ao trabalho duro.
- Thatcher ficou dentre os poucos deputados conservadores que apoiaram o projeto de lei para não se considerar a homossexualidade masculina como crime.
- Votou a favor do projeto de lei de para legalizar o aborto
- Votou a favor da proibição da caça à lebre.
- Apoiou a manutenção da pena de morte
- Votou contra a flexibilização das leis do divórcio.
- Impôs cortes de gastos públicos sobre o sistema estatal de ensino, resultando na eliminação do leite grátis para estudantes de 7 a 11 anos. Concordou em proporcionar às crianças mais novas um terço de um copo diariamente, para fins nutricionais. (Passaram a chamá-la como “seqüestradora de leite”)
- Em 1976 fez um duro discurso contra a URSS: “Os russos estão empenhados em dominar o mundo e estão rapidamente adquirindo os meios para se tornar a mais poderosa nação imperial que o mundo já viu. Os homens do Politburo soviético não têm que se preocupar com o fluxo e refluxo da opinião pública. Colocam as armas antes da manteiga, enquanto nós colocamos quase tudo antes das armas”. Dos russos, por causa deste pronunciamento, ganhou o apelido de Dama de Ferro.
- Thatcher praticou grande frugalidade em sua residência oficial, inclusive insistindo em pagar por sua própria tábua de engomar.
- Reduziu a inflação que chegara a alcançar 20% a.a.em seu governo às custas do desemprego que triplicou. As importações aumentaram, e a industria que era protegida pelo governo teve que se tornar mais competitiva. Empresas e bancos quebraram. Iniciou o processo de privatização. Reduziu os gastos sociais. Praticamente aboliu o salário mínimo. Perseguiu os sindicatos reduzindo-lhes a força. A Inglaterra entrou em recessão econômica.
- Em 1979 atacou a URSS culpado-a de atentar contra os direitos humanos quando esta ocupava militarmente o Afeganistão. Os russos a chamaram de “dama de ferro”. A relação entre a Rússia e a Inglaterra ficou instável desde então.
- Em 1982 o governo militar argentino ocupou as ilhas Falckland ou Malvinas. Thatcher que estava com problemas quanto à sua reeleição por causa do desemprego e da recessão, moveu suas forças para o Atlântico sul e derrotou os argentinos recuperando as ilhas. Reelegeu-se. Não fosse este tremendo erro argentino e Thatcher provavelmente não se reelegeria.
- Ainda em 1982 desejou por em prática um projeto que acabava com o serviço nacional de saúde e a educação gratuita, mas foi dissuadida e teve que engavetá-lo.
- Em 1984 reprimiu violentamente a greve dos mineiros além de outros graves conflitos sociais, e em outubro sofreu um atentado à bomba por um grupo de republicanos irlandeses. Limitou as greves.
- Rejeitou a união política e social com a União Européia.
- Criou um imposto, o “poll tax”, segundo o qual os pobres pagavam proporcionalmente mais do que os ricos. Perdeu o apoio popular e de seu próprio partido. Teve que pedir demissão do cargo em Downing Street 10.
- O Poll Tax foi abolido logo após a sua saída.
- Em 2000 começou a apresentar sinais de demência segundo sua filha Carol, e em 2003 foi aconselhada a não mais falar em público. Após vários acidentes cerebrais, faleceu em 2013.
O que significa “Margareth Thatcher” por alguns cantos do mundo:
1. No Reino Unido
- Irlanda do Norte: A divergência de opiniões no Reino Unido é gritante, democrática, mas nem sempre, porque dele faz parte a Irlanda do Norte e sua secular, quase milenar, repulsa a ser governada pela Inglaterra. Belfast, capital da Irlanda do Norte já foi palco de violentos combates quer pela independência, quer pela disputa entre católicos e protestantes. Como sempre, as opiniões se dividem e uns a vêem como a apoiadora e outros como a repressora.
- Inglaterra – Empresas, Bancos, a vêem como a grande líder que lhes daria maiores lucros e lhes permitiria penetrar mais facilmente no mercado internacional, embora pudessem ter reticências quanto à recusa de Margareth em participar na União Européia. Já para os trabalhadores, para o povo em geral, ela foi o diabo, o demônio de seus problemas financeiros, da degradação do acesso aos serviços públicos. Para os primeiros, uma neoliberal e protetora, para os segundos uma déspota. Não só pela imposição da força policial no controle das dissidências de rua, como também pela Poll tax. Na verdade, Margareth julgava-se a própria rainha, forte, austera, querendo impor a sua vontade e determinação. Reunia-se uma vez por semana com a rainha Elisabeth no palácio de Buckingham. Perdeu esta batalha.
Para os banqueiros e empresários ingleses, perderam uma grande aliada. Se as idéias de Margareth Thatcher tivessem vingado, os cidadãos ingleses passariam a vida lutando por salários para pagarem cada vez mais impostos, trabalhando duro para reduzir os custos dos produtos. Os banqueiros e empresários ficariam cada vez mais ricos, os trabalhadores cada vez mais sem serviços públicos, meros assalariados sob domínio do capital.
- Na União Européia
Logo após a saída de Thatcher o Reino Unido uniu-se à União Européia, mas não ao Euro, a moeda comum da UE. Se o fizesse, o Euro seria extremamente valorizado. Estamos em 2103 e o Reino Unido continua sem aderir no que pesem os esforços da Alemanha e da França para que o faça. A Noruega também não aderiu. Há algo que os ingleses e noruegueses percebem que os demais países europeus fingem não entender ou passam por cima: É extremamente difícil gerir uma comunidade com tantas e tão fortes idiossincrasias no que respeita à relação governo x população. Uns acham que o governo deve ser como um gestor forte da causa pública apoiando a população no máximo que puder. Outros acham que o governo manda e o povo contribui para que o governo exista sem muitas obrigações, o povo como fonte de renda para pagar seus cargos e seus devaneios.
Para os cidadãos da União Européia, Thatcher estava certa, porque atravessam uma crise na qual a Inglaterra está relativamente confortável. Para os governos ela nem deveria ter existido porque assim a Grã-Bretanha faria hoje parte do Euro, aportando capitais importantes para vencer a crise econômica. A herança da posição Thatcher ainda hoje persiste no Reino Unido no que respeita à UE.
- Na Argentina
Evidentemente que para os perseguidos políticos do regime ditatorial argentino a vitória de Thatcher nas Malvinas serviu para o inicio da derrocada da ditadura, no que pese o sentimento geral de que as Malvinas deveriam ser argentinas. Thatcher tinha cursos de nível superior e mal ou bem manteve a Inglaterra em sua posição de forte e organizada nação do cenário mundial. Hoje, na Argentina governa Cristina Kirshner que reaviva a questão das Malvinas, mas sem o brilho, o carisma, o conhecimento, a capacidade de Margareth Thatcher. Esta sabia o que faz. Cristina parece ser a dama deslumbrada narcisa de sua beleza frente ás câmaras. Para Cristina, beleza é fundamental.
- No resto do mundo
Margareth Thatcher sofria de uma doença muito comum entre quem desponta no cenário mundial como líder, sofre pressões de todos os tipos, adota a vida como um compromisso com a vitória e depois do auge vem a senilidade e com ela o declínio. Nesse momento, como vela que se apaga, o esforço para se manter à tona é demasiado, e sucumbem à fama e ao prestígio. É duro lidar com este tipo de perda. Afastam-se do público. Vivem no anonimato e no esquecimento até o dia de sua morte quando despontam nos noticiários da fama e voltam a “viver” por breves dias.
Margareth Thatcher ainda será bem e mal lembrada, embora com muito menos freqüência, ou quando comentarem : “ Já dizia a Thatcher”.
Depende de quem se lembre.
Rui Rodrigues
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